quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

E que a minha morte acenda outras formas de vida.

 “A morte me persegue. E hoje ela está vestida em chamas ardentes. Meu sangue ferve com o seu toque e o suor escorre pelo meu corpo. Sinto um calor intenso e não é o calor da batalha. É o calor da luta pela sobrevivência no inferno.”        
_Cuidado!!! Vladislav agarrou Verbena pela cintura e a puxou para junto a uma parede segundos antes de uma imensa tora flamejante caísse sobre ela.     
_Vocês estão bem? –Perguntou Andivari aproximando-se dos dois.

_Sim. Vladislav me salvou. Obrigada. –Disse Verbena esboçando um leve sorriso de agradecimento que escondia o seu olhar sofrido causado pelos tormentos do calor excessivo.
_Temos que encontrar Guntz e a jovem. Deve haver algum outro caminho que nos leve até a outra ala.          
_Temos é que sair desse inferno de Bël. Se continuarmos aqui certamente nós morreremos. –Reclamou Durkan que já mostrava indícios de fadiga causada pelo calor.                    
_Não sairemos daqui sem encontrá-los. Também não podemos voltar por aonde nós vimos. Teremos mais chance de sobrevivermos se permanecermos unidos.      
_Fale por si só. Vamos Drurkali, vamos encontrar uma saída daqui. –Durkan caminhou em direção oposta.    
_Esperem. Podemos encontrar uma saída juntos. –Insistia Andivari.      
_Não precisamos de vocês. –Disse Durkan olhando de soslaio.
Drurkali seguiu seu mestre com um olhar pesaroso no rosto. Os dois já estavam saindo de vista quando Drurkali ouviu Verbena gritar: _Esperem. Encontrei algo. Pode ser uma saída.        
Ao ouvi-la Durkan parou e olhou para traz. Viu Vladislav e Andivari removendo entulhos de uma parede enfumaçada.
_Encontramos uma rachadura na parede. Ela leva até ao outro lado. Podemos quebrar a parede, mas precisamos de ajuda.                 
Drurkali olhou para seu mestre esperançoso.       
_O que nos garante que não encontraremos outra sala dominada pelas chamas? Foi uma loucura entrar aqui. Não quero perder meu tempo ficando aqui dentro.  
_Alteza, se me permite dizer, o lugar por onde estamos já está dominado pelas chamas. Nós vimos quando a parte frontal do templo desmoronou. Não conseguiremos passar por lá. Temos que encontrar outra saída. E está pode ser uma opção.
Após refletir alguns segundos Durkan finalmente disse: _Tens razão leal companheiro. –E dirigindo-se a Verbena concluiu:_ Vamos ajudá-los a atravessar a parede mulher, mas depois seguiremos nosso próprio caminho. Ou vocês nos seguem para fora daqui ou podem morrer procurando aqueles dois infelizes.
_Que seja. –Afirmou Verbena. _Mas ajude-nos a atravessar essa parede antes que o teto sobre nós caia sobre nossas cabeças.            
Durkan e Drurkali aproximaram-se da fenda e juntos com Andivari e Vladislav começaram a golpear e remover entulhos. Logo que conseguiram abrir espaço suficiente, Verbena atravessou. Eles ainda teriam que quebrar mais um pouco até que também conseguissem atravessar.  
_O que você vê Verbena? Há alguma saída? Corredores, portas, qualquer coisa? Perguntou Andivari esperançoso.
_Há muita fumaça, mas não há chamas. É um imenso salão oval. Possui algo no meio... Vou averiguar. –Os passos de Verbena ecoaram pelo salão.   
_Espere! Estamos quase conseguindo atravessar. Ao notar que Verbena não lhe dera ouvidos, Andivari começou a empenhar com mais vigor na escavação da parede. Logo os quatro já podiam atravessar. Durkan foi o primeiro que atravessou. Seguido de Andivari, Vladislav e por fim, o gigante de ébano, Drurkali.
_É um poço. Cheio de água límpida e fresca. –Disse Verbena ao vê-los. Ela havia encharcado suas vestes com a água do poço e agora molhava os cabelos. A água amenizava o calor e trazia certo alívio. Logo todos também se refrescavam com a água do poço.  
O poço possuía aproximadamente dois metros e meio de raio. Ficava no centro do salão oval, que era escuro. Não havia janelas no salão e a iluminação provinha de velas e um lustre que balançava acima do poço. Ainda ouvia se estrondos e desmoronamentos ao redor do salão que provavelmente era localizado no centro do templo. O salão possuía duas portas. Uma em direção ao sul e outra ao norte.
Após alguns momentos de descanso, Andivari perguntou: _Qual porta seguiremos?        
_Irei pela do norte. –Afirmou Durkan. –E quem quiser seguir-me que aperte os passos, pois não suporto mais esse lugar.
_Certo Durkan. Mas procuraremos por Guntz, a jovem e as crianças pelas quais viemos até aqui. –Afirmou convicto Andivari.
_Essas crianças já estão mortas antes mesmo de entrarmos aqui. _Resmungou Durkan. –Eu avisei desde o inicio que era loucura entrar aqui.
_Não tem como você saber...
De repente um grito ecoou pelo salão vindo da porta norte.
 “Iiaarrhhhg!
_O que foi isso?
_Guntz. Afirmou convicta Verbena.    
Todos correram em direção à porta. Adentraram um corredor e prosseguiram por uns quinze metros até que um estrondo como um trovão seguido por uma tempestade de fumaça e poeira veio ao encontro deles. Após recuperarem da onda de poeira, recomeçaram a seguir a direção de onde havia vindo o grito. Depararam com outro salão parcialmente destruído, bastante semelhante ao outro. Todavia no meio deste encontrava se um monte de pedras e entulhos que haviam desabado do teto.
_Outro desmoronamento. –Confirmou Durkan.
_Vejam! –Chamou a atenção Vladislav. _Uma mão entre os destroços.
_Vamos! Ajudem-me. Logo todos retiravam blocos de pedras e vigas de madeira ou até mesmo peças de mármore. Aos poucos iam descobrindo o corpo. Ao terminarem encontraram Guntz jaz sem vida. Também encontraram o corpo de Mirla, a jovem sacerdotisa.
_Pobre Guntz.
Todos mantiveram a cabeça baixa e em silencio por alguns segundos. Lágrimas brotaram dos olhos de Verbena e por um momento, os cinco esqueceram-se dos males que os cercavam naquele lugar. Foi quando Drurkali percebeu algo.
_Ouçam... estou ouvindo gemidos. –Drurkali avançou novamente sobre o monte de entulho e destroços e começou a cavar. Ao remover uma enorme pedra encontrou uma grade de ferro que trancava um calabouço e dentro do calabouço viu vultos e ruídos.  
_São as crianças. Elas estão vivas.
Todos correram e começaram a remover o entulho de cima da grade.
_Aguentem firme crianças. Logo tiraremos vocês daí.
Eram ao todo seis crianças. Estavam com escoriações pelo corpo e uma delas jazia imóvel no chão. Por um momento exibiram um olhar esperançoso, mas um tremor e um novo desmoronamento fizeram com que se refugiassem no canto da parede do calabouço. Após o desmoronamento os cinco heróis retornaram aos esforços para libertarem as crianças.
_Parem com isso! –Gritou uma das crianças. _Vocês jamais conseguiram tirar esses destroços e romperem as correntes que prendem a grade antes que o resto do teto caia sobre vocês.
_O que você está dizendo garoto. Nós vamos tirar todos vocês daí. 
_Não. Não vão. Vão morrer assim como Mirla e o amigo dela. Vão embora agora e honrem a Deusa lutando por suas vidas.
_Não diga tolices garoto. Você não sabe o q... –Um novo desmoronamento interrompeu Andivari e desta vez um enorme bloco de pedra caiu em cima dos pés de Drurkali que caiu no chão gemendo de dor.  
_Eu estou falando... Vão embora. Salvem-se. Salvem-se. –Logo as crianças começaram a gritar em coro:
 _Salvem-se! Salvem-se! Salvem-se!
_Andivari, essas crianças tem razão. Com Drurkali ferido jamais conseguiremos libertá-las em tempo hábil. O teto está desabando sobre nossas cabeças.
_Não diga tolices covarde! Vamos salvar essas crianças. Além do mais Mirla disse que havia uma saída dentro dos calabouços.
_Mas ela está trancada e não tem como vocês romper a porta. –Disse uma jovem garotinha de dentro do calabouço.
_Há outra saída. –Afirmou outro garoto que tinha aproximadamente uns sete anos. _O poço do salão de orações. Se vocês mergulharem nele sairão em um rio subterrâneo que leva as cavernas antigas.
_É verdade! –Afirmou outra criança. _O bondoso Iamark nos ensinava que se algum dia algo ameaçasse nossas vidas e não houvesse saídas do templo, deveríamos mergulhar no poço e a Deusa nos guiaria para a liberdade.
_Não vamos desistir de vocês. –Insistiu Verbena.
_Sou Fildor, filho de Fiantys, sumo sacerdote de Iévine neste templo. Agradecemos a Iévine a vida que tivemos e nos preparamos para a hora da nossa morte. Vão e salvem suas vidas. Não a tempo a perder. Se eu puder fazer um pedido, peço apenas que me dê algo para dar um fim rápido a isso tudo.
_Pare de falar tolices garoto. Vamos Vladislav, Durkan, vamos tirar essas... –Andivari viu apenas de relance quando o punhal de Durkan passou pela grade do calabouço fazendo um “clank” quando o cabo da lamina bateu no metal da grade e foi parar nas mãos do garoto.
_DUURRKANNN, SEU MALDITO. O QUE VOÇÊ FEZ? –Andivari desferiu um cruzado de direita no queixo do príncipe cananor que o lançou longe. _Não faça isso garoto... vamos tirar vocês daí.
Um a um as crianças começaram a caminhar em direção a Fildor que aparentemente era o mais velho do grupo.
“_Agradeço a Iévine pela vida que tive. E que a minha morte acenda outras formas de vida.” - Após dizerem estas palavras Fildor passava a lamina em suas gargantas de forma rápida e habilidosa.
_Nããão! Pare com essa loucura. Nós vamos salvá-los. –Andivari puxava aos solavancos a corrente da grade. Verbena chorava em prantos e batia sua espada na corrente, mas nada parecia romper o metal. Seja lá qual metal fosse parecia possuir propriedades mágicas.
“_Agradeço a Iévine pela vida que tive. E que a minha morte acenda outras formas de vida.” - Três corpos jaziam no chão e o sangue escorria abundantemente entre eles.
Andivari estava de olhos arregalados. Balbuciava palavras sem nexo e a cicatriz de seu rosto parecia está sangrando. As veias de seu braço pareciam que iam explodir.
Quando a ultima criança, de aparentemente cinco anos aproximou se de Fildor, com os olhos tristes e lacrimejados começou a proferir as palavras. Vladislav que até então estava atônito se manifestou: _Garoto, o que está fazendo não é desejo de Iévine. Matar inocentes não é certo. A morte persegue a mim. Não persegue vocês. Prometo que vamos salvá-los.
_Não. –Respondeu secamente o garoto. _Não vai. –Fildor pegou sua lâmina e rasgou a garganta do garotinho. Logo em seguida olhou para Vladislav e disse: _A morte persegue a todos nós. E um dia ela chega a todos nós para que a nossa morte gere mais vida e Iévine seja glorificada. Quando os corpos jazem nos campos de batalha os vermes festejam e se banqueteiam. Eles também possuem vida, o dom de Iévine.   
Um forte estrondo fez ruir grande parte do teto fazendo com que todos tivessem que pular para os lados. Quando a fumaça e poeira abaixou um pouco viram que o calabouço estava soterrado novamente.
_Durkan, maldito. _Andivari pulou sobre Durkan e começou a esmurrá-lo na cabeça. O Príncipe cambaleou e caiu novamente. Andivari continuou a bater até que um barulho de osso partindo ecoou. Ainda assim Andivari continuou a esmurrar até que o rosto de Durkan não passava de uma pasta vermelha. Quando recobrou o juízo e se reergueu viu Drurkali atrás de si apoiado em uma só perna pronto para atacá-lo. Contudo o gigante de ébano ao notar que seu protegido estava morto sentou-se ao lado do corpo e disse: _Vão!
Sem dizerem uma palavra os três correram em direção ao corredor que levava ao poço deixando Drurkali ao lado do cadáver de Durkan. Tanto Vladislav quanto Verbena sabia que Drurkali poderia ter impedido Andivari. Mas os três seguiram silenciosos e ao chegarem ao poço tomaram fôlego e um de cada vez mergulhou.

Seus pulmões pareciam que iam explodir quando finalmente saíram em um rio subterrâneo. Ao chegarem à margem do rio depararam com uma enorme caverna. Podia se vê parte dos pilares que sustentavam o templo. Uma leva luz vinha de mais adiante de onde parecia ser uma saída. Quando por fim encontraram a fonte da luz viram uma caverna que dava saída para um bosque. Eles estavam fora da cidade a umas três milhas de distancia.  

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Sacrifício

Para qualquer canto que se olhava havia chamas e fumaça. A jovem sacerdotisa de Iévine corria pelas galerias do templo em chamas gritando o nome das crianças. Atrás dela vinha Guntz, o meio-elfo, Vladslav, Verbena, Andivari, Durkan e seu guarda-costas Drurkali.   
_Fildor..., Sazimira..., Esmerin..., Crion... , onde vocês estão? Respondam-me, por Iévine. –Gritava a moça._ Que vocês estejam bem. A jovem seguiu por um amplo salão que ameaçava ruir e entrou por uma porta enfumaçada quando de repente todos ouviram gritos.
_Socorro! Mirla, socorro, nós estamos aqui.
 Ao ouvir o chamado das crianças a jovem sacerdotisa saiu em disparada na direção dos gritos. _Estou indo crianças. Estou indo. Assim que a jovem atravessou um portal de mármore que estava flamejando, o mesmo ruiu e desmoronou. Em um ímpeto heroico Guntz pulou por entre as pedras de mármore que caiam e rodopiando o corpo em pleno ar atravessou os escombros em queda e aterrissou do outro lado intacto. Os outros estavam agora impedidos de passar por aquele caminho, mas Guntz estava junto a jovem.
         _Minha jovem, espere. Vamos devagar. _Suplicou Guntz a moça que não lhe deu ouvidos e saiu em disparada.
_Fildor..., Sazimira...,Doran..., onde vocês estão?
_Mirla, estamos aqui, socorro. _As crianças gritaram em uníssono.
Ao ouvir, até mesmo Guntz apressou-se a correr. Correram até um salão oval que provavelmente, em circunstancias normais estaria escuro, mas estava todo iluminado pelas labaredas de fogo que subiam pela parede. No centro do salão a jovem Mirla tentava levantar uma grade de ferro que fechava uma espécie de calabouço. Queimava suas mãos quando tocava o ferro aquecido pelo calor, mas mordia os lábios e fazia força para quebrar as correntes que prendiam a grade.

Guntz se aproximou ofegante e tossindo e pode notar seis crianças dentro do calabouço. _Deixe-me ajudá-la. Disse Guntz segurando uma ponta da grade de ferro. Os dois fizeram força vários momentos, mas em vão. Dentro do calabouço as crianças choravam desesperadas.  _Mirla, Mirla, socorro, nos tire daqui. Não queremos morrer. - Gritavam as crianças em desespero. Guntz e a jovem faziam força até seus braços tremerem e os rostos a ficarem vermelhos.
De repente Guntz percebeu pequenos estilhaços caindo em cima de seu ombro. Ao olhar para o alto viu que o teto começara a rachar com grande rapidez. Logo blocos inteiros começaram a cair no chão do salão ao lado deles. Os dois faziam uma força extrema, mas as correntes que prendiam a grade não ruíam de modo algum. Lá dentro as crianças choravam em desespero. Guntz tentou quebrar as correntes com sua adaga, mas foi em vão. O fogo já os rodeava e minavam suas forças. De repente Guntz viu um enorme bloco de mármore vindo na direção dos dois. Guntz jogou o corpo para puxar Mirla, mas ela estava agarrada a grade e não soltou até que o bloco caiu sobre eles. Guntz foi lançado uns dois metros do local com o impacto dos estilhaços, mas Mirla, ela foi atingida em cheio. Quanto Guntz conseguiu recobrar a consciência viu o corpo de Mirla com o crânio esmagado e o sangue escorrendo para dentro do calabouço de onde saia o choro angustiante e amedrontado das crianças.
Guntz perguntava a si mesmo o que poderia fazer. Não conseguiria romper as correntes que prendiam a grade do calabouço. Estava ferido e o teto continuava a desabar. _Seria tolice tentar salvar as crianças. Elas já estão condenadas. Muitas crianças morreram nesta guerra. – Pensava Guntz enquanto tentava se reerguer. Começou a caminhar em direção a uma saída quando os gritos ficaram mais altos.
_Socorro! Ajude-nos. Não queremos morrer aqui. –Gritavam as crianças.
Guntz tampou os ouvidos para não ouvi-las. O barulho das chamas e das pedras a cair aos poucos ia abafando os gritos. Logo Guntz já estava fora do salão. Cambaleando... Como um moribundo.
_Maldição! –Exclamou. _São apenas crianças. Guntz começou a correr novamente em direção ao salão oval. Ao chegar encontrou o salão ruindo e poeira e fogo para todos os lados. Correu até a grade do calabouço. Afastou pedras e o corpo da falecida jovem para o lado e começou a puxar a grade com todas as forças. Dentro do calabouço o choro das crianças se misturava com tosses e soluços.
_Afastem se para o canto crianças. –Ordenou Guntz. Segurando a grade com as duas mãos começou a puxar gritando bem alto. _Iiaarrhhhg!
Ao seu redor o salão ruía. Fogo se espalhava e pedras batiam no chão provocando ondas sonoras assustadoras. Guntz ainda gritava quando um estilhaço veio em direção a sua cabeça e ele tombou com a cara sob a grade que tentava abrir. Viu no escuro do calabouço, crianças assustadas. “_Acorde moço, acorde. Você tem que nos tirar daqui.” - Ouviu uma dizer.
 Sentiu pedregulhos caírem sobre seu corpo até que seu mundo apagou.

                                                                                        ...continua.