“A morte me persegue. E hoje ela está vestida
em chamas ardentes. Meu sangue ferve com o seu toque e o suor escorre pelo meu
corpo. Sinto um calor intenso e não é o calor da batalha. É o calor da luta
pela sobrevivência no inferno.”
_Cuidado!!! Vladislav agarrou Verbena pela cintura e
a puxou para junto a uma parede segundos antes de uma imensa tora flamejante
caísse sobre ela.
_Vocês estão bem? –Perguntou Andivari
aproximando-se dos dois.
_Sim. Vladislav me salvou. Obrigada. –Disse Verbena
esboçando um leve sorriso de agradecimento que escondia o seu olhar sofrido
causado pelos tormentos do calor excessivo.
_Temos que encontrar Guntz e a jovem. Deve haver
algum outro caminho que nos leve até a outra ala.
_Temos é que sair desse inferno de Bël. Se
continuarmos aqui certamente nós morreremos. –Reclamou Durkan que já mostrava
indícios de fadiga causada pelo calor.
_Não sairemos daqui sem encontrá-los. Também não
podemos voltar por aonde nós vimos. Teremos mais chance de sobrevivermos se
permanecermos unidos.
_Fale por si só. Vamos Drurkali, vamos encontrar
uma saída daqui. –Durkan caminhou em direção oposta.
_Esperem. Podemos encontrar uma saída juntos.
–Insistia Andivari.
_Não precisamos de vocês. –Disse Durkan olhando de
soslaio.
Drurkali seguiu seu mestre com um olhar pesaroso no
rosto. Os dois já estavam saindo de vista quando Drurkali ouviu Verbena gritar:
_Esperem. Encontrei algo. Pode ser uma saída.
Ao ouvi-la Durkan parou e olhou para traz. Viu
Vladislav e Andivari removendo entulhos de uma parede enfumaçada.
_Encontramos uma rachadura na parede. Ela leva até
ao outro lado. Podemos quebrar a parede, mas precisamos de ajuda.
Drurkali olhou para seu mestre esperançoso.
_O que nos garante que não encontraremos outra sala
dominada pelas chamas? Foi uma loucura entrar aqui. Não quero perder meu tempo
ficando aqui dentro.
_Alteza, se me permite dizer, o lugar por onde
estamos já está dominado pelas chamas. Nós vimos quando a parte frontal do
templo desmoronou. Não conseguiremos passar por lá. Temos que encontrar outra
saída. E está pode ser uma opção.
Após refletir alguns segundos Durkan finalmente
disse: _Tens razão leal companheiro. –E dirigindo-se a Verbena concluiu:_ Vamos
ajudá-los a atravessar a parede mulher, mas depois seguiremos nosso próprio
caminho. Ou vocês nos seguem para fora daqui ou podem morrer procurando aqueles
dois infelizes.
_Que seja. –Afirmou Verbena. _Mas ajude-nos a atravessar
essa parede antes que o teto sobre nós caia sobre nossas cabeças.
Durkan e Drurkali aproximaram-se da fenda e juntos
com Andivari e Vladislav começaram a golpear e remover entulhos. Logo que
conseguiram abrir espaço suficiente, Verbena atravessou. Eles ainda teriam que
quebrar mais um pouco até que também conseguissem atravessar.
_O que você vê Verbena? Há alguma saída?
Corredores, portas, qualquer coisa? Perguntou Andivari esperançoso.
_Há muita fumaça, mas não há chamas. É um imenso
salão oval. Possui algo no meio... Vou averiguar. –Os passos de Verbena ecoaram
pelo salão.
_Espere! Estamos quase conseguindo atravessar. Ao
notar que Verbena não lhe dera ouvidos, Andivari começou a empenhar com mais
vigor na escavação da parede. Logo os quatro já podiam atravessar. Durkan foi o
primeiro que atravessou. Seguido de Andivari, Vladislav e por fim, o gigante de ébano,
Drurkali.
_É um poço. Cheio de água límpida e fresca. –Disse Verbena
ao vê-los. Ela havia encharcado suas vestes com a água do poço e agora molhava
os cabelos. A água amenizava o calor e trazia certo alívio. Logo todos também
se refrescavam com a água do poço.
O poço possuía aproximadamente dois metros e meio
de raio. Ficava no centro do salão oval, que era escuro. Não havia janelas no
salão e a iluminação provinha de velas e um lustre que balançava acima do poço.
Ainda ouvia se estrondos e desmoronamentos ao redor do salão que provavelmente
era localizado no centro do templo. O salão possuía duas portas. Uma em direção
ao sul e outra ao norte.
Após alguns momentos de descanso, Andivari
perguntou: _Qual porta seguiremos?
_Irei pela do norte. –Afirmou Durkan. –E quem
quiser seguir-me que aperte os passos, pois não suporto mais esse lugar.
_Certo Durkan. Mas procuraremos por Guntz, a jovem
e as crianças pelas quais viemos até aqui. –Afirmou convicto Andivari.
_Essas crianças já estão mortas antes mesmo de
entrarmos aqui. _Resmungou Durkan. –Eu avisei desde o inicio que era loucura
entrar aqui.
_Não tem como você saber...
De repente um grito ecoou pelo salão vindo da porta
norte.
“Iiaarrhhhg!”
_O
que foi isso?
_Guntz.
Afirmou convicta Verbena.
Todos
correram em direção à porta. Adentraram um corredor e prosseguiram por uns
quinze metros até que um estrondo como um trovão seguido por uma tempestade de
fumaça e poeira veio ao encontro deles. Após recuperarem da onda de poeira,
recomeçaram a seguir a direção de onde havia vindo o grito. Depararam com outro
salão parcialmente destruído, bastante semelhante ao outro. Todavia no meio
deste encontrava se um monte de pedras e entulhos que haviam desabado do teto.
_Outro
desmoronamento. –Confirmou Durkan.
_Vejam!
–Chamou a atenção Vladislav. _Uma mão entre os destroços.
_Vamos!
Ajudem-me. Logo todos retiravam blocos de pedras e vigas de madeira ou até
mesmo peças de mármore. Aos poucos iam descobrindo o corpo. Ao terminarem
encontraram Guntz jaz sem vida. Também encontraram o corpo de Mirla, a jovem
sacerdotisa.
_Pobre
Guntz.
Todos
mantiveram a cabeça baixa e em silencio por alguns segundos. Lágrimas brotaram
dos olhos de Verbena e por um momento, os cinco esqueceram-se dos males que os
cercavam naquele lugar. Foi quando Drurkali percebeu algo.
_Ouçam...
estou ouvindo gemidos. –Drurkali avançou novamente sobre o monte de entulho e
destroços e começou a cavar. Ao remover uma enorme pedra encontrou uma grade de
ferro que trancava um calabouço e dentro do calabouço viu vultos e ruídos.
_São
as crianças. Elas estão vivas.
Todos
correram e começaram a remover o entulho de cima da grade.
_Aguentem
firme crianças. Logo tiraremos vocês daí.
Eram
ao todo seis crianças. Estavam com escoriações pelo corpo e uma delas jazia imóvel
no chão. Por um momento exibiram um olhar esperançoso, mas um tremor e um novo
desmoronamento fizeram com que se refugiassem no canto da parede do calabouço.
Após o desmoronamento os cinco heróis retornaram aos esforços para libertarem
as crianças.
_Parem
com isso! –Gritou uma das crianças. _Vocês jamais conseguiram tirar esses
destroços e romperem as correntes que prendem a grade antes que o resto do teto
caia sobre vocês.
_O
que você está dizendo garoto. Nós vamos tirar todos vocês daí.
_Não.
Não vão. Vão morrer assim como Mirla e o amigo dela. Vão embora agora e honrem
a Deusa lutando por suas vidas.
_Não
diga tolices garoto. Você não sabe o q... –Um novo desmoronamento interrompeu
Andivari e desta vez um enorme bloco de pedra caiu em cima dos pés de Drurkali
que caiu no chão gemendo de dor.
_Eu
estou falando... Vão embora. Salvem-se. Salvem-se. –Logo as crianças começaram
a gritar em coro:
_Salvem-se! Salvem-se! Salvem-se!
_Andivari,
essas crianças tem razão. Com Drurkali ferido jamais conseguiremos libertá-las
em tempo hábil. O teto está desabando sobre nossas cabeças.
_Não
diga tolices covarde! Vamos salvar essas crianças. Além do mais Mirla disse que
havia uma saída dentro dos calabouços.
_Mas
ela está trancada e não tem como vocês romper a porta. –Disse uma jovem
garotinha de dentro do calabouço.
_Há
outra saída. –Afirmou outro garoto que tinha aproximadamente uns sete anos. _O
poço do salão de orações. Se vocês mergulharem nele sairão em um rio subterrâneo
que leva as cavernas antigas.
_É
verdade! –Afirmou outra criança. _O bondoso Iamark nos ensinava que se algum
dia algo ameaçasse nossas vidas e não houvesse saídas do templo, deveríamos mergulhar
no poço e a Deusa nos guiaria para a liberdade.
_Não
vamos desistir de vocês. –Insistiu Verbena.
_Sou
Fildor, filho de Fiantys, sumo sacerdote de Iévine neste templo. Agradecemos a
Iévine a vida que tivemos e nos preparamos para a hora da nossa morte. Vão e
salvem suas vidas. Não a tempo a perder. Se eu puder fazer um pedido, peço
apenas que me dê algo para dar um fim rápido a isso tudo.
_Pare
de falar tolices garoto. Vamos Vladislav, Durkan, vamos tirar essas... –Andivari
viu apenas de relance quando o punhal de Durkan passou pela grade do calabouço
fazendo um “clank” quando o cabo da lamina bateu no metal da grade e foi parar
nas mãos do garoto.
_DUURRKANNN,
SEU MALDITO. O QUE VOÇÊ FEZ? –Andivari desferiu um cruzado de direita no queixo
do príncipe cananor que o lançou longe. _Não faça isso garoto... vamos tirar
vocês daí.
Um
a um as crianças começaram a caminhar em direção a Fildor que aparentemente era
o mais velho do grupo.
“_Agradeço a Iévine pela
vida que tive. E que a minha morte acenda outras formas de vida.” - Após dizerem estas palavras
Fildor passava a lamina em suas gargantas de forma rápida e habilidosa.
_Nããão!
Pare com essa loucura. Nós vamos salvá-los. –Andivari puxava aos solavancos a
corrente da grade. Verbena chorava em prantos e batia sua espada na corrente,
mas nada parecia romper o metal. Seja lá qual metal fosse parecia possuir
propriedades mágicas.
“_Agradeço a Iévine pela
vida que tive. E que a minha morte acenda outras formas de vida.” - Três corpos jaziam no
chão e o sangue escorria abundantemente entre eles.
Andivari
estava de olhos arregalados. Balbuciava palavras sem nexo e a cicatriz de seu
rosto parecia está sangrando. As veias de seu braço pareciam que iam explodir.
Quando
a ultima criança, de aparentemente cinco anos aproximou se de Fildor, com os
olhos tristes e lacrimejados começou a proferir as palavras. Vladislav que até
então estava atônito se manifestou: _Garoto, o que está fazendo não é desejo de
Iévine. Matar inocentes não é certo. A morte persegue a mim. Não persegue
vocês. Prometo que vamos salvá-los.
_Não.
–Respondeu secamente o garoto. _Não vai. –Fildor pegou sua lâmina e rasgou a
garganta do garotinho. Logo em seguida olhou para Vladislav e disse: _A morte
persegue a todos nós. E um dia ela chega a todos nós para que a nossa morte
gere mais vida e Iévine seja glorificada. Quando os corpos jazem nos campos de
batalha os vermes festejam e se banqueteiam. Eles também possuem vida, o dom de
Iévine.
Um
forte estrondo fez ruir grande parte do teto fazendo com que todos tivessem que
pular para os lados. Quando a fumaça e poeira abaixou um pouco viram que o
calabouço estava soterrado novamente.
_Durkan,
maldito. _Andivari pulou sobre Durkan e começou a esmurrá-lo na cabeça. O Príncipe
cambaleou e caiu novamente. Andivari continuou a bater até que um barulho de
osso partindo ecoou. Ainda assim Andivari continuou a esmurrar até que o rosto
de Durkan não passava de uma pasta vermelha. Quando recobrou o juízo e se
reergueu viu Drurkali atrás de si apoiado em uma só perna pronto para atacá-lo.
Contudo o gigante de ébano ao notar que seu protegido estava morto sentou-se ao
lado do corpo e disse: _Vão!
Sem
dizerem uma palavra os três correram em direção ao corredor que levava ao poço
deixando Drurkali ao lado do cadáver de Durkan. Tanto Vladislav quanto Verbena sabia
que Drurkali poderia ter impedido Andivari. Mas os três seguiram silenciosos e
ao chegarem ao poço tomaram fôlego e um de cada vez mergulhou.
Seus
pulmões pareciam que iam explodir quando finalmente saíram em um rio subterrâneo.
Ao chegarem à margem do rio depararam com uma enorme caverna. Podia se vê parte
dos pilares que sustentavam o templo. Uma leva luz vinha de mais adiante de
onde parecia ser uma saída. Quando por fim encontraram a fonte da luz viram uma
caverna que dava saída para um bosque. Eles estavam fora da cidade a umas três milhas
de distancia.