segunda-feira, 23 de maio de 2016

Assuntos de guerra

Aos primeiros raios de Álax os cavaleiros de Obadian Teron juntamente com os feridos Andivari, Vladislav e Verbena chegaram ao acampamento militar dos soldados de Obadian. Eles haviam cavalgado durante a noite toda. Eram mais de dois mil homens espalhados em tendas por todo o Vale. Uma carroça puxada por dois cavalos fortes e guiada por um soldado esguio levava Andivari e Vladislav que se encontravam feridos demais para cavalgarem enquanto que Verbena ganhara uma roupa nova e cavalgava ao lado do general Teron. Ela possuía alguns hematomas, mas nada grave comparado aos ferimentos de Andivari e Vladislav. Andivari já estava sofrendo as agonias febris de seu ferimento inflamado no rosto e o novo ferimento sofrido no ombro apenas agravou seu estado. Vladislav sofrera vários cortes por todo corpo. Nenhum havia sido fatal, mas a perda de sangue o deixara bastante debilitado.
Os homens no acampamento eram tagarelas por natureza. Por várias vezes Verbena ouviu comentários grosseiros e maliciosos ao seu respeito. Mesmo que tenham sido meros sussurros, não deixavam de deixá-la envergonhada e até enojada de alguns soldados.  Os soldados possuíam cabelos e barbas ruivas em sua maioria. Todos vestiam cotas de malha e mantas verde-musgo por sobre o ombro. Alguns ainda utilizavam chapéus de couro de raposa ou elmos de bronze sob a cabeça. Pela quantidade de rastros e merda de cavalo que havia no chão, estavam acampados naquele local por um longo tempo. Verbena viera, a saber, mais tarde que aquele era o ponto de apoio de onde partiam as buscas por fugitivos do povo de Stavianath. Ficava justamente na divisa entre Markden e Stavianath. Passaram por um descampado entre as tendas onde havia uma forca com seis cordas amarradas em forma de laço.
_Siga-me até minha tenda. –Disse Obadian Teron a Verbena quando adentraram o acampamento.
_Mas... Meus amigos...?!
_Não se preocupe com eles. Meu curandeiro irá cuidar de cada um deles pessoalmente.
            Não encontrando alternativa viável, Verbena seguiu Obadian pelo acampamento até sua tenda. Desmontaram de suas montarias e um criado cuidou de levar seus cavalos até o estábulo improvisado que havia sido construído na parte oeste do acampamento. O chão estava impregnado de lama e cada passo que dava Verbena sentia mais lama entre seus dedos que provavelmente havia entrado em sua bota por algum furo no solado.
            Quando estava passando pela entrada da tenda seguindo Obadian, foi barrada por um soldado que ficou entre ela e Obadian.
_Senhorita, me desculpe, mas terá que deixar sua espada comigo. -Disse o soldado apontando para a espada que Verbena trazia junto à cintura. _São regras para mantermos a segurança do general.
_Não é necessário soldado. Deixe-a passar. -disse Obadian virando se para trás ao perceber o que ocorria. _Se eu não for capaz de me defender de uma donzela, não sou merecedor do título de general.
_Como queira senhor. Mas todo cuidado é pouco. Temos tido problemas com mulheres armadas nesses últimos dias.

Verbena manteve a espada consigo e adentrou a tenda que era mais espaçosa do que parecia. Havia almofadas de plumas espalhadas pelo ambiente e um enorme tapete de peles de lobos no chão. Mesmo com a chuva do dia anterior, o chão permanecia sempre seco, pois a tenda havia sido construída numa enorme plataforma de madeira suspensa uns trintas centímetros do solo. Em uma mesa no centro estava estirado um mapa que Verbena julgou ser das redondezas. Um ponto no centro do mapa parecia indicar a localização do acampamento e três setas desenhadas no mapa apontavam para esse ponto vindo de diferentes lados.
_O que seu soldado quis dizer com “mulheres armadas nesses dias”? -questionou Verbena como quem inicia uma conversa aleatória para cortar o silêncio constrangedor. _Não vi nenhuma mulher no acampamento em momento algum.
_Algumas mulheres têm feito ataques ao nosso acampamento. Elas vêm de canto algum, galopando em cima de seus cavalos e armadas com arcos de longo alcance, efetuam uma saraivada de flechas sobre nós e fogem para a floresta logo em seguida. Um grupo tentou segui-las, mas foram emboscados e mortos a algumas léguas daqui. Os homens as estão chamando de “as viúvas de Stavianath”. Mas não se preocupe. Destaquei um grupo seleto de soldados para descobrirem o esconderijo dessas senhoras e convencê-las que a luta delas está perdida e o melhor a fazerem seria se entregarem.
_Se entregarem para serem estupradas por seus homens? - perguntou Verbena com um tom de indignação na voz mais acentuado do que pretendia ter dito. 
_Não sou homem que apoie esse tipo de violência. -respondeu Obadian Teron enquanto se servia de uma taça de vinho e enchia outra para Verbena. _Você mais do que  ninguém  deveria ter consciência disso.
_Não é o que dizem os sobreviventes das vilas por onde você e seus homens passaram.  As marcas da crueldade estão cravadas na terra por onde seus homens pisam.
_A guerra por si só é cruel, mulher. Muitos morrem e às vezes não são somente soldados. Mas não acredite em boatos que os ventos da desgraça trazem. Eu trato meus prisioneiros com dignidade. Alimento cada um deles todos os dias. E os mantenho protegidos do frio. Você mesma poderá ver com seus próprios olhos se assim desejar. Mas porque essa preocupação toda com os Sthavianathos?  Não foram eles que estavam atacando você e seus amigos quando nós a salvamos de ser violada?
_Sim. E serei eternamente grata por isso, senhor general. Mas não creio que todo um povo mereça meu desprezo por causa de alguns homens. Essa guerra toda é muito confusa para mim. O povo de Stavianath se mostrou bastante hospitaleiro quando estive entre eles. Antes de isso tudo acontecer… - por um momento Verbena se perdeu em um devaneio. Lembrou-se do jovem príncipe Gamblior. De como ele falava da princesa Kathrina. De como ele era apaixonado por ela e de como ela também olhava para o príncipe. Um olhar de amor correspondido. Agora ambos estavam mortos. O mundo é injusto! -concluiu seus pensamentos. _Ainda assim, eu mesma vi a crueldade com o qual os soldados atacaram Stavianath.
_ No ataque a Stavianath os soldados de meu povo ainda estavam irados pela atitude impensada dos príncipes de Stavianath. Como representantes de um povo, os príncipes agiram erroneamente declarando guerra a toda uma nação utilizando como motivo um crime ainda não resolvido. -argumentava Obadian Teron enquanto bebericava seu vinho. _ Claro que era somente uma desculpa para atacar um reino que vinha crescendo economicamente graças a suas minas de Tolnd. Somos um povo pacífico, mas quando descobrimos que nós seriamos os próximos alvos dos príncipes guerreiros, não restou outra coisa a não ser atacar com tudo. Era plano dos Sthavianathos dominar seu povo para tomar as minas de Tolnd e logo em seguida atacar meu povo por causa de nossas extensas florestas que é uma rica fonte de boa madeira. Com essas ações eles não só quebrariam todos os acordos do tratado da trindade do norte como levaria nossos reinos a falência.
_ E o que viria ser o tratado da trindade do norte? -perguntou verbena enquanto se sentava em um amontoado de almofadas de plumas e encostava as costas na estaca central da tenda.
_Bem, - começou Obadian Teron inflando o peito e demostrando um prazer agradável naquela conversa. _O tratado da trindade do norte foi um documento assinado pelos três maiores reinos do norte. Era um documento que alegava união, apoio e amizade entre os reinos de Hellin-Odel, Stavianath e Markden. Diz à história que esse tratado fora assinado logo após o termino da Grande Batalha contra os Kandors, séculos atrás.
_Kandors? Eles realmente existiram? -perguntou Verbena com uma tonalidade meiga na voz.
_Bem, se eles existiram, eu não sei por que nunca vi um. Mas nos relatos mais antigos da história, os Kandors são relatados como seres vindos do céu e que…
            E assim o dia foi passando. Uma taça se tornou uma jarra e logo se quase se tornou duas. Verbena estava grata por ter aprendido a beber grandes quantidades de vinho com seu falecido irmão. Verdade era que Verbena estava com muito medo de Obadian Teron. Tudo que ela queria era se juntar aos seus amigos e saírem o mais depressa daquele lugar. Ela vira com os próprios olhos o massacre promovido pelos soldados markdenos na capital de Stavianath e nada que Obadian Teron dissesse a faria se sentir segura. Mesmo tendo sido salva por eles, ainda temia pela vida. Todavia o dia ocorreu tranquilo. Ao meio dia fora servido uma refeição farta e durante a tarde foi levada até a tenda onde seus amigos estavam sendo tratados. Vladislav despertou ao entardecer, mas Andivari dormiu durante o dia e a noite toda. Verbena também vira a prisão de madeira onde mais de duzentas mulheres, crianças e velhos eram mantidos. A falta de homens fortes na prisão confirmou as suspeitas de Verbena de que Obadian Teron não era homem de deixar inimigos que o ameaçasse vivo.

Obadian Teron deu lhe passe para ir e vir no acampamento. “_ para que você possa vê seus amigos à hora que você desejar.” - ele dissera. Mas Verbena sentia que sempre havia alguém a observando. Seguindo seus passos. 

Um comentário:

  1. Acho que devia voltar a escrever...e continuar a história. Principalmente os capítulos sobre Verbena.

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